Uma vez, fui parar na diretoria com a Mari, uma das amigas do Quarteto, pois deduraram que a gente estava de namorico na entrada. Isso era proibido. O rapazinho era um vizinho gentil que nos acompanhou até a escola. Ao contrário de minha amiga tagarela, eu fiquei muda durante todo o caminho e mais muda ainda com a cara incrédula da madre superiora: “Vizinho? Olha o narizinho!”. Eu queria mais era desenhar e costurar modelitos para minhas bonecas. Era a pura verdade, mas a madre não via nada de puro nisso. Até que as cobranças e os hormônios falaram mais alto para gostar de alguém. Mas quem?
A resposta veio do fundo do mar, mais precisamente, das ondas da televisão. Lá estava meu primeiro amor: loiro, bronzeado e dublado. O nome dele era Sandy, o menino do seriado Flipper, exibido nos anos 70. Eu tinha uns 12 anos e ainda morria de vergonha de meninos. Para minha sorte, ele morava a muitas milhas de distância, impossibilitando um encontro cara a cara. Confesso que nada foi planejado. Aconteceu ao mudar de canal. Então, mergulhei naquela aventura platônica, contando os minutos para chegar a hora de assistir às peripécias do golfinho Flipper com os irmãos Sandy e Bud. Tinha consciência de que aquela paixão morreria na praia. Mas, pelo menos, eu já podia dizer com toda a ingenuidade do primeiro amor: “Sim, estou apaixonada.”
Outras paixões vieram, às vezes em forma de boto ou com jeito de tubarão, fazendo com que eu me debatesse nesse mar de sentimentos. Bebi muita água. O último amor ancorou há uns 20 anos, sem semelhança alguma com o loiro bonitão da ficção. Baixinho, gordinho, simpático, está mais para ruivinho Bud e, como eu, é amante do mar. Qual é o segredo para não mudar de canal? Não sei exatamente. Sei que já demos boas risadas e braçadas. Enfrentamos todo tipo de maré e aprendemos a nadar juntos. E haja fôlego para seguir nossos dois filhos que nadam lá na frente. Arriscamos até no nado borboleta. E eu, que me escondia dos meninos, agora tenho três em casa.